ARTÉRIA
DE CALIBRE PERSlSTENTE EM LÁBlO INFERIOR.
REVlSTA DA LITERATURA E RELATO DE CASO.
*Elio
Hitoshi 'SHINOHARA
**José Maria BERTÃO
***Marcelo Macedo CRIVELINI
****Alvimar LIMA de CASTRO
****Éder Ricardo BIAZOLLA
A Artéria de Calibre
Persistente, foi descrita como anomalia vascular onde ramo arterial atinge
a camada submucosa, sem diminuição de seu calibre. Descrita
originalmente no final do século XIX como patologia gástríca,
o primeiro relato na boca foi feito apenas em 1973. Esta entidade patológica
era descrita como rara na boca até 1998, quando um grupo de patologistas
definiram ser entidade vascular comum.
O objetivo deste trabalho seria o de familiarizar o cirurgião-dentista
clínico com esta anomalia vascular, que apesar de ser considerada
comum, é pouco relatada ; é feito o relato de caso, a revista
de conceitos, aspecfos clínicos, tratamento e é abordada a
discutível semelhança clínica entre a artéria
de calibre persistente e o carcìnoma epidermóide de lábio
inferior.
Unitermos: Artéria de calibre persistente, mucosa bucal, diagnóstico.
Artéria de calibre
persistente ( A.C.P.) foi definida como sendo ramo arterial que atinge
a camada submucosa sem diminuição de seu calibre4.
Segundo MIK11 et al. ( 1980), a primeira descrição
desta entidade patológica foi atribuída à Gallard
em 1884, que relatou 3 casos fatais de hemorragia gástrica devido
à ruptura de artérias calibrosas anormalmente situadas na
camada superficial submucosa do estômago. Posteriormente foram relatados
casos ocasionais ainda no estômago ( CHAPMAN;LAPIl, 1963; MILLARD13,
1955) e no intestino delgado ( MATUCHANSKY10 e colab.,
1978). VOTH14 em 1962 sugeriu o termo descritivo
persistência de calìbre , para denomìnar esta anomalia
arterial e MATUCHANSKY10et al. ( 1978) sugeriu o
termo grande artéria calibrosa solitária.
Na boca, o primeiro relato de artéria de calibre persistente, foi
feito em 1973 por HOWELL; FREEMAN3, com uso do termo
artéria Iabial inferior proeminente. Neste trabalho, os autores
relataram 7 casos com tumefação pulsátil em lábio
inferior próximo à semimucosa ; porém foi MIK11
et al. ( 1980) que ao relatarem mais 3 casos estabeleceram o termo artéria
de calibre persistente.
JASPERS4 em 1992 levantou 5 relatos na literatura
de A.C.P. na boca e acrescentou 2 casos. LOVAS ; GOODDA6(
1993) levantaram 14 casos relatados e descreveram mais 2.
Em 1998, MANGANARO8 referindo MIKO11
et al. ( 1980) como pioneiros na descrição desta
anomalìa vascular na boca, totalizou 7 relatos prévios e
acrescentou 2 casos. Até então A.C.P. era tida como anomalia
vascular rara. Ainda em 1998, LOVAS7 e colab. reuniram
16 caso prevìamente relatados e acrescentaram outros 210 casos,
descrevendo então a A.C.P. como anomalia vascular comum na boca.
Neste trabalho, é feíto o relato de caso, assim como a revisão
de conceitos , aspecto clínico, tratamento e é abordado
a discutivel semelhança clinica entre a artéria de calibre
persistente e o carcinoma epidermóide de lábio inferior.
Paciente masculino
, 67 anos , leucoderma , foi encaminhado à Clínica de Estomatologia
da F.O. Araçatuba-UNESP, para avaliação de lesão
em lábio inferior, com 1 mês de evolução referida.
À ectoscopia apresentava-se corado, hidratado e com estruturas
faciais dentro da normalidade. À oroscopia notava-se mucosas íntegras,
coradas, elásticas e úmidas; dentes em regular estado de
conservação e higiene. Em mucosa labial inferior esquerda,
notou-se lesão tubular submucosa, serpentiforme, pulsátil
com ritmo arterial, de coloração violácea, com cerca
de 1,0 cm em maior diâmetro e recoberta por mucosa normal, sem infiltração
de base e sem sinais inflamatórios ( fig. 1 ).
Em história pregressa, paciente não referia trauma e nem
hábitos locais. Clinicamente não foi encontrado nenhum indício
sugestivo de presença no tecido adjacente, de massiva proliferação
vascular. Frente a estes dados, foi feito o diagnóstico presuntivo
de artéria de calibre persistente labial.
Sob anestesia local, realizou-se exploração cirúrgica
da área pulsátil e na camada submucosa , no sentido póstero-anterior,
detectou-se artéria com calibre aproximado de 1 mm ( fig.2).
Este vaso foi isolado e ligado com fio de algodão 2-0 e foi removido
sua porção superficializada. Após limpeza e irrigação
da cavidade cirúrgica, a mucosa foi suturada com fio de seda 4-0.
Foi prescrito analgésico,o período pós-operatório
evoluiu sem intercorrências. E a sutura, removida no 70 dia.
A análise anatomopatológica da peça coletada revelou
fragmento de artéria, o que, pela sua posição anormalmente
superficial, foi conclusiva para o diagnóstico de artéria
submucosa de calibre persistente (fig.3).
O termo descritivo
Artéria de Calibre Persistente ( A.C.P.), foi utilizado
inicialmente para denominar anomalia vascular na submucosa do estômagoll.
Os primeiros trabalhos que relataram esta anomalia vascular na boca, a
associavam à lesão ulcerada de mucosa, possivelmente pela
isquemia que a pulsação vascular imprimia à mucosa
( MARSHALL; LEPPARD9 , 1985; MIKO 11et
al., 1980) e que dava origem à necrose e à ulceração
tecidual. MIKO 11 et al. ( 1980) relataram 3 casos
de A.C.P.
em lábio inferior que clinicamente apresentavamse como úlceras
que simulavam o carcinoma epidermóide. MIKO 12
et al. ( 1983), descrevem outro caso de A.C.P. Neste relato, a anomalia
vascular estava , de fato ,associada à carcinoma epidermóide
de lábio inferior. Estes autores sugeriram que a úlcera
crônica produzida por esta anomalia vascular tenha estimulado a
transformação epitelial maligna.
Em 1985, MARSHALL; LEPPARD9, descreveram caso de
A.C.P. que também acometia lábio inferior, estando associado
à úlcera com 5 meses de evolução. Realizaram
cirurgia com margem de segurança, pois ,segundo os autores, a úlcera
era clinicamente compatível com carcinoma epidermóide, porém
o exame anatomopatológico foi compatível com lesão
benigna.
Neste relato , o aspecto clínico era de lesão tubular pulsátil
à palpação e ao exame visual. Não foi visto
úlcera na mucosa ,aspecto este também descrito em alguns
trabalhos ( HOWELL; FREEMAN3 , 1973; LOVAS ; GOODDAY6
, 1993; MANGANARO8, 1998).
O tratamento de eleição é a remoção
cirúrgica do vaso superficializado, principalmente nos casos sob
risco de mordedura mucosa e naqueles pacientes propensos à quedas
da própria altura (usuários de álcool, p. ex. ),
e nos pacientes incomodados com a pülsação. LOVAS7
et al. ( 1998), referem que na maioria das vezes, a A.C.P. é
um achado clínico e sendo assim , não requerem tratamento;
porém todos os casos descritos associados à lesão
ulcerada foram cirurgicamente tratados.
A literatura refere a apresentação clínica da A.C.P.
como lesão ulcerada, semelhante ao carcinoma epidermóide
( HARSANYI; ELGENEIDY2 , 1990; MARSHALL; LEPPARD9
, 1985; MIKO11et al., 1980), sendo até realizado
tratamento cirúrgico com margem de segurança ( MARSHALL;
LEPPARD9 , 1985). No trabalho de MIKO11
et al ( 1980), os autores mostraram 3 casos de úlcera em
lábio inferior, todas na semimucosa apresentando superfície
crostosa, e segundo os autores, compatível com ' carcinoma epidermóide.
Avaliamos este trabalho e acreditamos que nos 3 casos relatados, não
haviam evidências sugestivas para elaboração de diagnóstico
presuntivo de carcinoma, apesar do tempo de evolução ( 24,
14 e 2 meses); tendo 0 primeiro paciente, lesão ulcerada com 1
cm de diâmetro, já sería vísível e palpável
elevação de borda e infiltração de base, o
que não foi relatado no trabalho. Também não acreditamos
que a A. C.P. seja pré-maligna como referido por MARSHALL; LEPPARD9
(1985); se assim fosse, encontraríamos mais relatos desta anomalia
associada aos tumores de estômago e boca. Acreditamos que a A.C.P.
seja um hamartoma, assim como a grande parte dos chamados hemangiomas.
LOVAS7 et al. ( 1998) revisaram arquivos de anatomia
patológica de 5 universidades e coletaram 210 casos de A.C.P. e
referiram como achado clínico primário a presença
de lesão submucosa pulsátil, sem predileção
por sexo, acometendo adultos e não associada à úlcera
labial e sem características de carcinoma epidermóide. Sendo
descrita como anomalia vascular comum. Antes deste trabalho, foram descritos
ern revistas internacionais apenas 16 casos de A . C. P. labial ; sendo
portanto lesão relativamente nova e pouco conhecida pelo clínico
e pelo patologista.
Apresentamos o relato de caso desta lesão pouco descrita e mesmo
sendo considerada comum por um autor que reuniu 210 casos , acreditamos
em sua raridade clínica; em tempo, por analogia LÓPEZ-RÍOS5
et al. ( 1997), referindo trabalhos anteriores, citam que existem aproximadamente
250 relatos de cisto nasolabíal e sabemos o quanto é íncomum
encontrarmos pacientes portadores deste cisto na clínica diária.
Figura
l.Aspecto clínico de mucosa de lábio inferior, mostrando
lesão tubular, submucosa ( setas), pulsátil e recoberta
por mucosa normal.
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Figura
2.Aspecto clínico trans-operatório.Visualização
de artéria calibrosa na submucosa de lábio inferior
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Figura
3.Aspecto microscópico da peça coletada. Nota-se padronização
celular de fragmento de artéria normal. ( Hematoxilina -
Eosína, X 40.)
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The caliber-persistent
artery was descríbed as a vascular anomaly in which the arterial
branch reaches the submucosa layer without caliber reduction . It was described
in the end of the XIX century as a gastric pathology and the first related
case in the oral cavity was only made in 1973. This pathology was thought
as rare in mouth until 1998, when a group of pathologists defined it as
common vascular entity. The subject of this paper was to aid the clinical
dentist to identify this vascular anomaly that although is considered common
it just has a few works about it. Its paper presented a case report, a review
of the currents concepts, clinical aspects, treatment and the uncertain
link between the caliber- persistent artery and the epidermoid carcinoma
of the lower lip.
Uniterms: Caliber-persistent artery, oral mucosa, diagnosis.
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* Cirurgião bucomaxilofacial, Conjunto Hospitalar do Mandaqui -
SUS l SP. Professor Assistente da Disciplina de Cirurgia e Traumatologia
Bucomaxilofacial do Curso de Ciências Odontológicas da UNIMAR.,
e aluno de pós-graduação em Estomatologia. nível
doutorado. Faculdade de Odonlologia de Araçatuba-UNESP.
** Professor da Faculdade de Odontologia da Universidade do Oeste Paulista-
UNOESTE , Presidente Prudente - SP. Aluno de pós-graduação
em Estomatologia, nível doutorado, Faculdade de Odontologia de
Araçatuba-UNESP..
*** Professor Assistente Doulor. Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP.
**** Professor Adjunto. Disciplina de Estomatologia. Faculdade de Odontologia
de Araçatuba-UNESP.
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