ATIVIDADE
INIBITÓRIA DE CIMENTOS IONOMÉRICOS CONVENCIONAIS E FOTOPOLIMERIZÁVEIS
SOBRE STREPTOCOCCUS MUTANS
INHIBITORY ACTIVITYOF CONVENTIONAL AND LIGHT CURED GLASS
IONOMER CEMENTS ONSTREPTOCOCCUS MUTANS
Elerson GAETTI-JARDIM JÚNIOR*
Denise PEDRINI**
Guilherme Gabaldi PELLI***
Walter Roberto SCHILLER****
A cárie secundária
representa sério problema na clínica odontológica.
A restauração de dentes acometidos por cárie ou outras
patologias pode criar condições favoráveis à
proliferação de patógenos na superfície do material
restaurador ou na interface dente/restauração, tornando o
ambiente propício para o estabelecimento de cárie secundária.
Desta forma, foi objetivo deste estudo avaliar a atividade antimicrobiana
de cimentos de ionômero de vidro convencionais e fotopolimerizáveis
e da resj,pa Z 100, utilizada como controle. Empregouse o método
de difusão em agar e o meio de cultura foi o agar Mueller-Hinton
acrescido de 5% de sangue desfibrinado de cavalo. As placas previamente
inoculadas com 108 células de S. mutans ATCC 25175 foram incubadas
a 37°C, em microaerofilia, por 48 horas, realizando-se, a seguir, a
leitura dos resultados medindose o halo de inibição do crescimento
bacteriano. Verificou-se que a resina composta Z 100 não apresentou
atividade antimicrobiana enquanto que o cimento ionomérico Vitremer
produziu os maiores halos de inibição do crescimento bacteriano.
UNITERMOS: Cárie dental; Placa bacteriana; Cimentos de ionômero
de vidro.
A colonização
das restaurações e de suas margens por microrganismos cariogênicos
pode propiciar as condições para o estabelecimento de cárie
secundária, condenando a restauração ao fracasso2,16.
Esses aspectos se agravam quando a restauração está
posicionada na região subgengival, ou próximo à margem
gengival, onde microrganismos periodontopatogênicos poderiam comprometer
a condição periodontal adjacente.
Os cimentos de ionômero de vidro vêm ganhando destaque como
materiais ,para cimentação, base cavitária e como
materiais restauradores em função de suas propriedades físico-químicas
e biológicas. Dentre os cimentos ionoméricos restauradores,
os fotopolimerizáveis apresentam, também, propriedades aprimoradas
quando comparados aos ionômeros de vidro convencionais8.
De acordo com SVANBERG et al.15 (1990), a placa
bacteriana que coloniza a superfície de restaurações
de cimentos de ionômero de vidro apresenta um maior número
de microrganismos do que a observada sobre restaurações
de resina composta, embora o número de Streptococcus do grupo mutans
tenha-se mostrado menor sobre esses cimentos ionoméricos, o que
colaboraria para diminuir a acidogenici.dade e cariogenicidade dessa microbiota,
sendo que uma possível atividade antimicrobiana desses materiais
sobre S. mutans poderia ser a responsável por esse fenômeno.
Objetivo
Tendo em vista a importância dos materiais restauradores na Clínica
Odontológica, o presente estudo teve o objetivo de avaliar, "in
vitro", a atividade antimicrobiana de cimentos ionoméricos
restauradores convencionais e fotopolimerizáveis.
Materiais restauradores
Foram utilizados os cimentos de ionômero de vidro convencionais
Chelon Fil (Espe, Alemanha) e Vidrion R (SS White, Brasil), fotopolimerizáveis
como Vitremer (3M, Brasil) e Fuji II LC (GC, Japão), e a resina
composta Z100 (3M, Brasil), empregada como controle. Corpos-de-prova de
5 mm de diâmetro e 1 mm de espessura foram confeccionados para cada
matérial, seguindo, para tanto, as recomendações
dos fabricantes.
Método de análise, meio de cultura, inóculo bacteriano
e leitura
Utilizou-se o método de difusão em agar. O meio de cultura
empregado foi o agar Mueller Hinton acrescido de 5% de sangue desfibrinado
de cavalo. A inoculação das placas com 108 células
bacterianas foi realizada por intermédio de zaragatoas alginatadas
30 minutos antes da colocação dos corpos-de-prova.
As placas inoculadas e os corpos-de-prova foram incubados em dessecadores,
em condições de microaerofilia pela técnica da chama
de vela, a 37°C, por 48 horas. A seguir realizou-se a leitura dos
resultados medindo-se o diâmetro dos halos de inibição
do crescimento bacteriano, o qual foi expresso em milimetros.
Análise estatística
Os resultados obtidos foram submetidos à análise estatística,
utilizando, para tanto, o teste de
Kruskal-Wallis.
Verifica-se,
pela Tabela 1, que os cimentos ionoméricos convencionais (Chelon
Fil, Vidrion R) e o fotopolimerizável Fuji II L.C. apresentaram
atividade antimiçrobiana discreta, pouco diferindo entre si. O
cimento ionomérico Vitremer apresentou notável atividade
antimicrobiana quando comparado aos demais. A resina composta Z 100 não
apresentou qualquer efeito inibitório sobre a copa de S. mutans
testada.
TABELA
1 -Atividade antimicrobiana de cimentos ionoméricos convencionais
e fotopolimerizáveis e da resina Z100 sobre S. mutans ATCC
25175.
|
Material
restaurador
|
Diâmetro médio dos halos de
inibição do crescimento (mm)
|
Chelon
Fil
Vidrion R.
Vitremer
Fuji II L.C.
Z 100
|
8,5
8,5
23,0
7,0
0,0
|
Embora o emprego clínico
dos cimentos iondméricos tenha-se ampliado em função
de suas propriedades, como o poder anticariogênico e adesão
aos tecidos dentais6,20, esses materiais também
apresentam características precárias, como a maior rugosidade
superficial, quando comparadas às resinas compostas, o que permite
maior retenção de placa bacteriana5,13,
podendo agravar as condições dos tecidos periodontais adjacentes.
Neste aspecto, o conteúdo resinoso presente nos cimentos ionoméricos
fotopolimerizáveis e na resina composta, contribuindo para aprimorar
as características superficiais dos materiais, pode diminuir a
retenção de placa, prevenindo alterações periodontais.
Os cimentos ionoméricos podem atuar na prevenção
da cárie secundária aumentando a resistência do esmalte
à desmineralização e facilitando a reincorporação
do mineral perdido, bem como interferindo no crescimento de microrganismos
cariogênicos, como sugerem BERG et al.1 (
1990) e GARIB et al.7(1993).
Dentre os cimentos ionoméricos fotopolimerizáveis, o Vitremer
mostrou os melhores resultados produzindo halos de inibição
muito superiores aos observados para os demais materiais. Nesse sentido,
a seleção de uma microbiota menos cariogênica sobre
os cimentos ionoméricos, como demonstrado por TOBIAS et al. (1985)17,
pode refletir o efeito do flúor liberado por esses materiais3,
o que demonstra que o conteúdo resinoso de ionômeros fotopolimerizáveis
não interfere sobremaneira na liberação desses íons,
o que está de acordo com a literatura4,18.
Os níveis de liberação de flúor por cimentos
ionoméricos decresce substancialmente com o tempo6.19.20,
de forma que o efeito desses materiais sobre a microbiota varia de intensidade
ao longo do tempo. Contudo, mesmo em concentrações subinibitórias,
o flúor é capaz de exercer notáveis efeitos sobre
a acidogenicidade e a capacidade de adesão de Streptococcus do
grupo mutans, deprimindo-as10,14, 0 que pode ser
clinicamente significativo, como coloca BERG et al.1
( 1990).
Embora os cimentos ionoméricos convencionais tenham mostrado atividade
antimicrobiana, FORSS et al. ( 1991 )5 demostraram
que a atividade antimicrobiana desses materiais, associada à liberação
de flúor, não era capaz de compensar a maior retenção
de microrganismos, em função de sua maior rugosidade superficial,
quando comparados a resinas híbridas, como a Z 100.
Contudo, visto que o flúor liberado por esses materiais pode afetar
de diferentes formas o metabolismo bacteriano, deprimindo a formação
de polissacarídeos intracelulares em Streptococcus do grupo mutans21,
inibindo vias metabólicas, especialmente a glicólise, reduzindo
a adsorção desses microrganismos à hidroxiapatita
recoberta por saliva, inibindo a colonização dos tecidos
dentais11,12 afetando a atividade da membrana citoplasmática
bacterianag, estudos "in vivo" terão de ser realizados
para confirmar ou não a influência desses fenômenos
sobre a colonização da interface dente / restauração
por S. mutans.
Assim, um melhor conhecimento das interações dos diferentes
materiais restauradores com a microbiota do hospedeiro é fundamental
para a escolha de materiais que minimizem a problemática da cárie
secundária, colaborando para o restabelecimento do equilíbrio
dessa microbiota, que constitui uma das bases da manutenção
da saúde bucal.
O presente estudo,
após ser analisado e discutido nos permite concluir que:
1. Dos cimentos ionoméricos testados, apenas o
Vitremer apresentou atividade antimicrobiana significaxiva;
2. O conteúdo resinoso do cimento de ionômero de vidro Vitremer
não afeta a capacidade do material restaurador em inibir o crescimento
bacteriano;
3. A resina composta Z 100 não apresentou atividade antimicrobiana;
4. Os cimentos
ionoméricos Fuji II.L.C, Chelon Fil e Vidrion R. mostraram ape-
nas discreta atividade antimicrobiana.
The secondary caries
represent health problems in Dentistry. The restoration of teeth can produce
conditions to proliferation of microorganisms in the marginal gap and on
the surface of the restorative material, which could lead to favorable conditions
to secondary caries. Thus, this study aims at evaluating the inhibitory
activity of conventional and light cured restorative glass ionomer cements
and composite Z 100 on Streptococcus mutans ATCC-25175. It was used an agar
difusion method, and the culture medium was Mueller-Hinton agar supplemented
with 5% of defibrinated horse blood. The plates, previously innoculated
with 108 cells of S. mutans ATCC-25175, were incubated at 37°C, in candle
jars, for 48 hours. The results were obtained by measuring the halos of
bacterial growth inhibition. It was verified that Z100 was not able to inhibit
the bacterial strain, while Vitremer produced the highest halo of inhibition
of bacterial growth.
UNITERMS: Dental caries; Dental plaque; Glass ionomer cements.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS |
l.BERG, J.H., FARREL,
J.E., BROWN, L.R. Class II glass ionomer/silver cermet restorations and
their effect on interproximal grow of mutans streptococci. Pediatr. Dent.,
v. 12, p. 20-3, 1990.
2.BROWNE, R.M., TOBIAS, R.S. Microbial microleakage and pulpal inflammation:
a review. Endod. Dent.
Traumatol., v. 12, p. 177-83, 1996.
3.CARDOSO, D.C. et al. Efecto del fluoruro liberado a partir de ionômero
de vidro sobre Streptococcus mutans. Rev. ADM, v. 51, n. 5, p.285-87,
1994.
4.DUNNE, S.M. et al. Caries inhibition by a resin-modified and a conventional
glass ionomer cement, in vivo.
J. Dent., v. 24, 91-4, 1996.
5.FORSS, H., SEPP~l, L., ALAKUIJALA, P. Plaque accumulation on glass ionomer
filling materials. Proc. Ftnn. Dent. Soc., v. 87, n. 3, p. 343-50, 1991.
6.FORSTEN, L. Short and long-term fluoride release from glass ionomer
and other fluoride containing filling materials in vitro. Scand. J. Dent.
Res., v. 98, p. 17985, 1990.
7.GARIB, T.M., ROSA, O.P.S., ROCHA, R.S.S. Ação antimicrobiana
de cimentos de ionômero de vidro restauradores. Rev. Fac. Odontol.
Bauru, v. 1, n. 1, p. 1-5, 1993.
8.GONZÁLEZ, C.C. Aplicaciones clínicas del cemento de ionómero
vítreo. Reu. Asoc. Odontol. Argent., v. 81, p. 71-8, 1993.
9.HAMILTON, I.R. Biochemical effects of fluoride on oral bacteria. J.
Dent. Res., v. 69, sp. iss., p. 660-67, 1990. lO.IZAGUIRRE-FERNANDEZ,
E.J., EISENBERG, A.D.
Interation of zinc with fluoride on growth, glycolysis and survilval of
Streptococcus mutans GS-5. Caries Res., v. 23, p. 18-25, 1988.
ll.KUFMAN, M., BARTHOLMES, P. Purification, characterization and inhibition
by fluoride of enolase from Streptococcus mutans DSM 320523. Caries Res.,
v. 26, p. 110-16, 1992.
l2.MEURMAN, J.M. Ultraestructure, growth and adherence of Steptococcus
mutans after treatment with clorehexidine and íluoride. Caries
Res., v. 22, p. 22887, 1988.
l3.SLOTS, J. Selective medium for Actinobacillus actinomycetemcomítans.
J. Clín. Microbiol., v. 15, p. 606-609, 1982.
l3.SMALES, R.J. Plaque growth on dental restorative materials. J. Dent.,
v. 9, p. 133-40, 1981.
l4.SVANBERG, M., KRASSE, B., ~RNERFELDT, H.O. Mutans streptococci in interproximal
plaque from amalgam and glass ionomer restorations. Caries Res., v. 24,
p. 133-36, 1990.
l5.SVANBERG, M., MJ~R, I.A., ORSTAVIK, D. Mutans streptococci in plaque
from margins of amalgam, composite, and glass-ionomer restorations. J.
Dent. Res., v. 69, n. 3, p. 861-64, 1990.
l6.TAYLOR, M.J., LYNCH, E. Microleakage. J. Dent., v. 20, p. 3-10, 1992.
l7.TOBIAS, R.S., BROWNE, R.M., WILSON, C.A. Antibacterial activity of
dental restorative materials. Int. Endod. J., v. 18, p. 161-71, 1985.
l8.TORABZADEH, H., ABOUSH, Y.E.Y., LEE, A.R. Comparative assessment of
long-term fluoride release from ligthcuring glass-ionomer cements. J.
Dent. Res., v. 73, p. 853, 1994.
l9.TVEIT, A.B., GJERDET, N.R. Fluoride release from a fluoride-containing
amalgam, a glass ionomer cement and a silicate cement in artificial saliva.
J. Ora1 Rehab., v. 8, p. 237-41, 1981.
2O.WILSON, A.D., GROFFMAN, D.M., KUHN, A.T. The release of fluoride and
other chemical species from a glass ionomer cement. Biomaterinls, v. 6,
p. 43133, 1985.
2l.ZAMECK, R.L., TINANOFF, N. Effects of NaF and SnF2 on growth, acid
and glucan production of several oral streptococci. Arch. Oral Biol.,
v. 32, n. 11, p. 807-810, 1987.
* Professor
Assistente Doutor da Faculdade de Odontologia da UNESP, Araçatuba
- SP, Brasil. ** Professora Assistente da Faculdade de Odontologia da
UNESP, Araçaqtuba - SP, Brasil.
*** Aluno de graduação da Faculdade de Ciências Odontológicas
e Prótese da UNIMAr, Marília - SP, Brasil.
**** Professor da Faculdade de Ciências Odontológicas da
UNIMAR. Endereço para correspondência: R. José Bonifácio
1193, Vila Mendonça. CEP 16015-050, Araçatuba - SP, Brasil.
Tel (018) 624-5555 r 409.
|